28. novembro 2022
Notícia
Lula e os povos indígenas do Brasil
O novo presidente eleito do Brasil, Luis Inácio “Lula” da Silva, quer atender com mais peso às preocupações dos povos indígenas. Para sua vitória, ele recebeu ajuda de alianças com grupos políticos cujos interesses se confrontam. Isto pode ser um obstáculo para suas promessas eleitorais. Uma avaliação de Vinícius da Silva Machado, consultor da APA no Brasil, da situação dos povos indígenas em relação à mudança de governo em Brasília.
Imagem: Indígenas que protestam contra o governo Bolsonaro, 2021.
(Foto: Scoot e Aranduhá / APIB)
A eleição presidencial no Brasil teve sua definição no último dia 30 de outubro de 2022. Foi eleito, para o seu terceiro mandato, o ex-sindicalista, Luís Inácio Lula da Silva, candidato da esquerda, representante do Partido dos Trabalhadores (PT), com 60,1 milhões de votos. Em uma disputa acirrada, contra Jair Messias Bolsonaro, candidato do Partido Liberal (PL), de extrema direita, com uma diferença de 2,1 milhões de votos, a menor diferença desde a redemocratização brasileira em 1985. Vitória da aliança das forças democráticas e progressistas que compõem a coligação Brasil da Esperança, formada pelos partidos de esquerda e centro esquerda.
PROMESSA DE LULA PARA OS POVOS INDÍGENAS
Durante a campanha Lula conseguiu reunir diversos grupos ao seu redor. Entre eles os povos indígenas do Brasil, prometendo ações, políticas e iniciativas que garantam os seus direitos. No seu plano de diretrizes para o programa de reconstrução e transformação do Brasil, Lula se comprometeu com a proteção dos direitos e dos territórios dos povos indígenas. Afirma ter o dever de assegurar a posse de suas terras, impedindo atividades predatórias, que prejudiquem seus direitos. Diz ser fundamental implementar políticas que lhes assegurem vida digna e cidadania, respeitando e valorizando sua cultura, tradições, modo de vida e conhecimentos tradicionais.
Também, prevê o combate ao uso predatório dos recursos naturais e vai estimular as atividades econômicas com menor impacto ecológico. Para isso, diz ser necessário recuperar as capacidades estatais, o planejamento e a participação social fortalecendo o Sistema Nacional de Meio Ambiente e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI). Órgãos completamente sucateados com o último governo.
Seu plano apresenta o Brasil como um grande produtor mineral, a atividade minerária deve ser estimulada por meio de maiores encadeamentos industriais internos e compromisso com a proteção ao meio ambiente, direitos dos trabalhadores e respeito às comunidades locais. Ademais, o padrão de regulação minerária deve ser aperfeiçoado e a mineração ilegal, particularmente na Amazônia, será duramente combatida. São promessas e compromissos de campanha defendidos ao longo das eleições pelo candidato petista. Promessa ousadas, como será essa regulamentação, e de que forma se diferenciará das ações do atual governo Bolsonaro? Um alerta que deve estar ligado.
Durante o seu discurso da vitória, Lula assegurou a criação do um Ministério dos Povos Originários, e da necessidade de os indígenas estarem a frente. “Estamos encerrando um governo fascista. Um governo que não gosta de gente. Um governo que não gosta de negro. Um governo que não gosta de indígena. Aliás, para os indígenas, vou criar o Ministério dos Povos Originários para que eles nunca mais sejam destratados”, afirmou Lula. Garante que uma pessoa indígena deverá assumir o novo ministério. Em seu discurso na avenida paulista, após o resultado das eleições, afirmou que “não vai ser branco como eu ou uma galega como a Gleisi [Hoffmann, presidente do PT]. Terá que ser um índio ou uma índia”, na direção do novo ministério, afirmou o candidato eleito.
ARTICULAÇÃO DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL APOIA LULA
Propostas que foram defendidas pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB). Em uma carta a articulação pediu aos brasileiros e aos povos originários que votassem em Lula à presidência do Brasil. A organização se diz contrária à gestão do atual presidente Bolsonaro, que concorreu à reeleição, e critica ações do atual governo.
Afirmam que os direitos fundamentais dos povos foram submetidos a um regime de regressão e supressão, seja por meio de medidas administrativas como o Decreto 11. 226, que suspendeu os comitês regionais da FUNAI. Seja através de dezenas de iniciativas legislativas, como o PL-191/20, que visa legalizar a exploração de minerais, água e recursos orgânicos nas reservas indígenas. Todas estas medidas colocam em risco a vida e continuidade enquanto povos social, étnica e culturalmente diferenciados, um risco aos mais de 305 povos diferentes e falantes de mais de 274 línguas existentes no Brasil.
Segundo a carta não é só por esse cenário de maldades que definem o candidato Bolsonaro que os povos indígenas devem votar no ex-presidente Lula. Afirmam que é necessário ir além “Precisamos interromper esses processos de destruição. Nossa luta é por nossos Povos, sim, mas também pelo futuro de todos e todas as brasileiras e pela humanidade inteira! É hora de construirmos um projeto civilizatório de país e de mundo” (APIB, 2022)
É PRECISO ESTAR ATENTO
Promessas que podem ser compridas, mas, é preciso estar atento e alerta. Nos seus últimos mandatos, Lula construiu uma relação dúbia com os povos indígenas, ora defendendo interesses que feriam os povos originários, como a construção de Belo monte, hora tomando decisões que os beneficiavam de forma direta e irrestrita como o sancionamento da convenção 169 da Organização do Trabalho (OIT). É necessário fazer vigilância, ter atenção ao seu governo, pois, dentro das forças progressistas que fazem parte dele, estão partes do agronegócio e da mineração, setores que podem causar grande problemas e violações aos povos indígenas.
O advogado e antropólogo social Vinícius Brito da Silva Machado é especialista em direitos indígenas. É conselheiro da Associação para os Povos Ameaçados (APA Suíça) no Brasil.